2.2- Lógica Dialética Transcendental: É uma crítica da
aparência dialética, enquanto crítica do entendimento e da razão, para
desmascarar a falsa aparência das presunções e reduzir as suas pretensões
graças aos princípios transcendentais, reduzindo estas pretensões (de
descoberta e extensão) à simples ação de julgar o entendimento puro e
acautelá-lo de ilusões.
A aparência, contudo, em Kant tem um significado
diferente daquele que estamos habituados a perceber deste termo. Para já
há que distingui-la, tanto da verossimilhança que guarda, ainda que
insuficientemente uma marca da verdade, como do fenômeno que é objecto da
intuição e, por conseguinte, apresenta um conteúdo material, dado numa
experiência espacial - temporalmente localizada e categoricamente
determinada, ao longo de um processo que envolve uma dupla síntese: ao
nível da sensibilidade e ao nível do entendimento.
Em contraste com estas duas noções, que, de algum
modo, lhe estão aparentadas - que mais não seja, em virtude de um núcleo
comum de experiência originária de que os três vocábulos participam - a
"aparência transcendental" diz respeito, fundamentalmente, a todo um uso
da razão que transcende os limites da experiência possível, a ponto de
tomar a necessidade subjetiva em que se encontra de ligar entre si certos
conceitos por uma necessidade objetiva de determinação de coisas em si.
A dialética vem por conseguinte a ocupar-se do estudo
das funções da razão pura no seu uso meta - empírico, isto é, numa
aplicação que transgride as regras fundamentais da possibilidade de
conhecimento, as quais impõem como necessidade para que ele possa
propriamente verificar-se uma experiência em que e pela qual a forma
categorial receba um preenchimento concreto.
A falta de um objeto adequado para a projeção
(formal) racional empiricamente intangível vem, por conseguinte a determinar
a estrutural incapacidade cognitiva da razão pura teórica.
"Uma vez , portanto, que ela ( a lógica) apenas
poderá ser reciprocamente um cânone para a apreciação do uso empírico ( do
entendimento), é mal utilizada quando é tomada como o organon de um uso
geral e ilimitado e se ousa julgar, afirmar e decidir sinteticamente sobre objetos em geral com o entendimento puro apenas. Deste modo, o uso do
entendimento puro seria, então dialéctico."
Este uso dialéctico do entendimento puro seria, por
conseguinte, ilegítimo, na medida em que se lhe pretenderiam atribuir
virtualidades cognoscitivas meta - empíricas ou transcendentes. Ao
constituir-se como cânone, a lógica não pode prescindir dos conteúdos
concretos a que se aplica e que em forma. O conceito não pode passar sem a
intuição, sob pena de permanecer no elemento da mera vacuidade.
No entanto, ao nível da razão, este intento de
transcendência dos seus limites cognoscitivos estruturais aparece, para
Kant, como algo de radicalmente estabelecido, difícil mesmo de ser
aniquilado ou irradicado. Não há verdadeiramente um conhecimento do
objecto de uma ideia transcendental e, no entanto, sempre segundo Kant,
nós somos conduzidos até às ideias transcendentais por meio de raciocínios
necessários que aspiram a formas cada vez mais amplas de verificação
sintética, de totalização.
Vem assim, a abrir-se aqui, por um lado todo o tema
do uso regulador da razão pura teórica e, por outro lado, o da
inviabilidade de uma dialética da razão pura. A procura do incondicionado
inscreve-se como exigência reitora do uso da razão na sua demanda de
unificação suprema. A cada nova tentativa, porém, a impossibilidade humana
de conhecer a coisa em si ou a totalidade absoluta se revela como um
limite criticamente intransponível.
"A razão pura tem sempre a sua dialética, seja ela
considerada no seu uso especulativo como no prático; pois ela requer a
totalidade absoluta das condições para um dado condicionado e essa (
totalidade), muito simplesmente, só pode ser encontrada nas coisas em si."
É pois neste contexto que a dialética
transcendental se vê obrigada a desempenhar a sua função crítica, ao
detectar as ilusões em que os juízos transcendentais nos lançam e ao
procurar evitar que caiamos nos seus enganos.
Vemos, deste modo, que, para Kant, a dialética
tanto pode qualificar um determinado uso meta - empírico do entendimento
puro ou da razão pura, como representar a atividade crítica que visa
estudar esse emprego cognoscitivamente ilegítimo e controlar os seus
efeitos.
Todos os homens se concebem livres quanto à vontade.
Daí provêm todos os juízos sobre cações tais que deveriam ter, embora não
tenham, acontecido. No entanto esta liberdade não é um conceito da
experiência. Por outro lado, é necessário que tudo o que acontece seja
determinado por leis naturais, e esta necessidade natural não é também um
conceito da experiência. Por isso a liberdade é apenas uma ideia da razão
cuja realidade objetiva é em si duvidosa; a natureza, porém, é um
conceito do entendimento que demonstra, e tem necessariamente de
demonstrar, a sua realidade por exemplos da experiência.
Se o pensamento da liberdade se contradiz a si mesmo
ou à natureza, que é igualmente necessária, teria ela que ser abandonada
inteiramente em face da necessidade natural. É impossível escapar a esta
contradição; se o sujeito que se crê livre pensasse no mesmo sentido ou na
mesma relação quando se chama livre que quando se considera submetido à
lei natural, com respeito à mesma ação.
Por isso é um problema inevitável da filosofia
especulativa (dialética) mostrar, pelo menos, que a sua ilusão por causa
desta contradição assenta em que pensamos o homem em sentido e relação
muito diferente quando lhe chamamos livre do que quando o consideramos
como peça da natureza e submetido às suas leis, e que ambos, não só podem
estar juntos, como devem ser pensados como necessariamente unidos no mesmo
sujeito.
Por outras palavras, enquanto ser livre o homem é
númeno, enquanto ser natural ou da natureza o homem é fenômeno.
De notar, contudo, que esta intrusão do homem no
domínio numénico é feita de uma forma condicional. O númeno é a coisa em
si, ou seja, o que está para além do mero fenómeno e da mera manifestação.
O númeno é fenômeno e substância, é ser. Ora, o homem, enquanto ser
racional não tem acesso ao conhecimento do númeno, ou seja, das coisas em
si, dos seus princípios, da sua substância.
Para ele, enquanto ser racional, inserido no
processo natural, o seu conhecimento é feito através das manifestações dos fenômenos, das intuições ( que são fenómenos intuídos que deixaram por
isso de ser chamados de fenômenos ) e dos conceitos à priori que são
igualmente formas intuídas ( embora não se chamem de intuições)
transportadas para dentro do conhecimento do homem e que lá existem à
priori mas que se pressupõe sempre terem originariamente tido o seu
princípio remoto na experiência.
A prova da sua validade enquanto conceitos obtém-se
pela experimentação. Tudo aquilo que o homem conhece resulta da
experiência - diz-nos Kant. E acrescenta, mas nem tudo o que o homem
conhece é através da experiência. Ou seja, admite Kant a possibilidade de
um conhecimento interiorizado (intuído mas que não é intuição) que existe
à priori no homem de forma conceptual como fazendo parte de um todo conceitual que se desmembra no objeto dado ( e no conhecimento á priori
deste) quando solicitado pela sensibilidade ( e não pela sensação, não
fazer confusão).
Em qualquer dos casos o conhecimento do homem,
imediato ou mediato tem sempre como prova a experiência ( antes ou após a
obtenção do conhecimento) e o seu conhecimento é fenoménico, ou seja,
processa-se através das manifestações de objetos dados.
Ora, no mundo numénico, que é o mundo das coisas em
si, das substâncias, dos princípios primeiros, da verdade (entendida no
seu sentido absoluto e incontestável e não em termos de verdade lógica)
não têm lugar os fenômenos ou se eles têm lugar o homem não tem
possibilidade de se aperceber deles porque esse é um mundo inteligível, ou
seja, um mundo apenas pensado (ideal) e não um mundo vivido.
A pretensão legítima que mesmo a razão humana vulgar
tem à liberdade da vontade funda-se na consciência e na pressuposição
admitida da independência da razão quanto a causas determinantes puramente subjetivas, que no conjunto constituem o que pertence somente à sensação
e, por conseguinte, cai sob a designação geral de sensibilidade.
Assim, esta intrusão do homem no mundo numénico
processa-se não como forma de conhecimento mas como forma de
inteligibilidade, ou seja, resulta do facto de a razão, por si só, e
admitindo a sua independência enquanto razão ( pura) do mundo limitado dos
fenómenos
(que é o mundo da natureza) se pensar a si mesma como
suficiente para apreender a inteligibilidade desse mundo numénico.
O homem que, desta maneira, se considera como
inteligência, coloca-se assim numa outra ordem de coisas e numa relação
com princípios determinantes de espécie totalmente diferente, quando se
pensa como inteligência dotada de vontade e por conseguinte de
causalidade, do que quando se percebe como um fenómeno no mundo sensível (
o que realmente também é ) e subordina a sua causalidade, segundo leis da
natureza, a uma determinação externa. Ora em breve se pensa que ambas as
coisas podem e até devem acontecer ao mesmo tempo.
Pois que uma coisa na ordem dos fenómenos ( como
pertencente ao mundo sensível) esteja submetida a certas leis, de que essa
mesma coisa, como coisa ou ser em si, é independente, isso não contém a
menor contradição; mas que o homem tenha de representar-se e pensar-se a
si mesmo desta maneira dupla, isso funda-se, para o primeiro caso, na
consciência de si mesmo como objeto afetado pelos sentidos, para o
segundo na consciência de si mesmo como inteligência, quer dizer, como ser
independente, no uso da razão, de impressões sensíveis (portanto como
pertencente ao mundo inteligível).
Ao introduzir-se assim pelo pensamento num mundo
inteligível, a razão prática não ultrapassa em nada os seus limites; mas ultrapassá-lo-ias se quisesse entrar nesse mundo por intuição, por
sentimento. A razão, igualmente ultrapassaria todos os seus limites se se
arrojasse a explicar como é que a razão pura pode ser prática, o que seria
a mesma coisa que explicar como é que é possível a liberdade. Pois nós
nada podemos explicar senão aquilo que possamos reportar a leis cujo objeto possa ser dado em qualquer experiência possível.
Ora a liberdade é uma mera ideia cuja realidade objetiva não pode ser de modo algum exposta segundo leis naturais e,
portanto, em nenhuma experiência também, que, por consequência, uma vez
que nunca se lhe pode sub por um exemplo por nenhuma analogia, nunca pode
ser concebida nem sequer conhecida.
Ora, onde cessa a determinação segundo leis
naturais, cessa também toda a explicação. De notar que Kant explicita
muito claramente que aquilo que é cognoscível é transmissível, ou seja,
que aquilo que se conhece se pode explicar. Ora o mundo numénico não tem
explicação assente na racionalidade do homem, é uma ideia, que se pode
expor e se expõe, mas de uma forma declarativa - expositiva, insusceptível
de ser discutida quanto ao seu fundamento e substância, embora formalmente
possa ser exposta, ou seja, possa ser exposta quanto à sua forma e não
quanto ao conteúdo que essa forma em si transporta ( ou não transporta).
A impossibilidade subjetiva de explicar a liberdade
da vontade é idêntica à impossibilidade de descobrir e tornar concebível
um interesse que o homem possa tomar pelas leis morais; e no entanto é um
facto que ele toma realmente interesse por elas, cujo fundamento em nós é
o que chamamos sentimento moral. Como uma razão pura possa ser prática,
eis o que toda a razão humana é absolutamente incapaz de explicar.
É aqui, pois, que se encontra o limite extremo de toda
a investigação moral; mas determiná-lo é de grande importância. Quer
dizer, o limite da investigação racional do inteligível, ou seja, a razão
não pode ir além desse limite sob risco de deixar de ser razão e passar a
ser também ideia, com toda a substância que o termo razão implica em si em
termos de conhecimento.
Por outras palavras, Kant delimita muito claramente
os limites da razão não por "razões" do inteligível, mas porque não quer
torpedear a própria razão dando-lhe um conteúdo eminentemente ideal o que
levaria a pensar-se onde começa o ideal e acaba a razão e vice-versa.
Esta separação importante para Kant separa também a
possibilidade de entrada do homem (basicamente - fenómeno) no domínio do
númeno ainda que quando ele assim procede, intrusamente, o faça em nome da
razão pura, afastada de qualquer fenómeno, mas dela originária em termos
formativos. Estabelecer uma ligação menos nítida entre um campo e outro
levaria in extremis à idealidade do fenómeno, e logo, à idealidade de tudo
aquilo que homem considera conhecer efetivamente.
De resto a ideia de um mundo inteligível puro, como
um conjunto de todas as inteligências, ao qual pertencemos nós mesmos como
seres racionais ( posto que, por outro lado, sejamos ao mesmo tempo
membros do mundo sensível) continua a ser uma ideia utilizável e lícita em
vista de uma crença racional, ainda que todo o saber acabe na fronteira
deste mundo, para, por meio do magnífico ideal de um reino universal dos
fins em si mesmos ( dos seres racionais), ao qual podemos pertencer como
membros logo que nos conduzamos cuidadosamente segundo máximas de
liberdade como se elas fossem leis da natureza, produzir um nós um vivo
interesse pela lei moral.
O uso especulativo da razão, com respeito à
natureza, conduz à absoluta necessidade de qualquer causa suprema do
mundo; o uso prático da razão, com respeito à liberdade, conduz também a
uma necessidade absoluta, mas somente das leis das acções de um ser
racional como tal. Ora, é um princípio essencial de todo o uso da nossa
razão levar o seu conhecimento até à consciência da sua necessidade ( pois
sem ela não seria nunca conhecimento da razão).
Mas também é uma limitação igualmente essencial da
mesma razão não poder ela conhecer a necessidade nem do que existe ou
acontece, nem do que deve acontecer, sem por uma condição sob a qual isso
existe ou acontece ou deve acontecer. Desta sorte, porém, pela constante
pesquisa da condição, vai sendo sempre adiada a satisfação da razão.
Por isso ela busca sem descanso o incondicional-
necessário e vê-se forçada a admiti-lo, sem meio algum de o tornar
concebível a si mesma; feliz bastante quando pode achar já só o conceito
que se compadece com este pressuposto.
Não é pois nenhum defeito da nossa dedução do
princípio supremo da moralidade, mas é sim uma censura que teria de
dirigir-se à razão humana em geral, o ela não poder tornar concebível uma
lei prática incondicionada ( como tem que sê-lo o imperativo categórico )
na sua necessidade absoluta; pois não há que censurá-la por que ela o não
queira fazer por meio de uma condição, quer dizer, por meio de qualquer
interesse posto por fundamento, porque então não seria uma lei moral, isto
é, uma lei suprema da liberdade.
E assim nós não concebemos, na verdade, a necessidade
prática incondicionada do imperativo moral, mas concebemos, no entanto, a
sua inconcebilidade, e isto é tudo o que, com justiça, se pode exigir de
uma filosofia que aspira atingir, nos princípios, os limites da razão
humana.
Esta afirmação merece um comentário: na verdade, e
Kant recua oportunamente, o que se trata nesta intrusão do homem fenómeno
( ainda que na sua posição de homem dotado de razão pura) é de, ao mostrar
a inconcebilidade ( logo, a incognoscibilidade ) do imperativo moral,
mostrar ao mesmo tempo que o mesmo, não sendo cognoscível pela razão
humana, pertence de facto ao mundo numenal, ou seja, que ao não pertencer
ao racionável pertence ao inteligível ( o pensável e apenas pensável,
logo, ideal).
2.1.1- Lógica analítica transcendental: É a parte da
lógica transcendental que apresenta os elementos do conhecimento puro do
entendimento e os princípios sem os quais nenhum objeto pode, em
absoluto, ser pensado. É uma lógica da verdade.
A analítica, na terminologia de Kant, não acrescenta
conhecimento ao conhecimento que já existe. É uma ideia, ou um conjunto de
ideias, que se pressupõe ser verdadeira porque não oferece dúvida quanto à
sua veracidade.
Verdade: A verdade consiste na concordância de um
conhecimento com o seu objecto. Esse objeto tem, por isso, de
distinguir-se de outros; pois um conhecimento é falso se não concorda com
o objeto a que é referido, embora contenha algo que poderia valer para
outros objetos.
Ora um critério geral da verdade seria aquele que fosse
válido para todos os conhecimentos, sem distinção dos seus objetos. Como
acima já designamos por matéria o conteúdo de um conhecimento, teremos de
dizer: não se pode exigir nenhum critério geral da verdade do
conhecimento, quanto à matéria ( ou conteúdo), porque tal seria em si
mesmo contraditório.
Assim o critério puramente lógico da verdade, ou
seja, a concordância de um conhecimento com as leis gerais do entendimento
e da razão, é uma condição sine qua non, por conseguinte a condição
negativa de toda a verdade; mas a lógica não pode ir mais longe, e quanto
ao erro que incida, não sobre a forma, mas sobre o conteúdo, não tem na
lógica solução.
As fontes donde advém a analítica são duas, conforme
já vimos: empíricas e puras , ou seja, as primeiras resultam ( na sua gênese) de dados da experiência e as segundas resultam ( na sua gênese) de
dados da razão comprováveis pela experiência.
A apresentação que Kant faz da sua analítica
transcendental é aqui transcrita:
"Na presunção de que talvez hajam conceitos que se
relacionam a priori com os objectos, não como intuições puras ou
sensíveis, mas sim como atos do pensamento puro, e que, por consequência
são conceitos, mas conceitos cuja origem não é empírica, nem estética, nós
fazemos desde já ideia de uma ciência do entendimento puro e do
conhecimento racional pela qual nós pensamos os objetos exclusivamente a
priori. Uma tal ciência, que determinaria a origem , a extensão e o valor objetivos destes conhecimentos, deveria chamar-se pelo nome de lógica
transcendental, porque, ao mesmo tempo que ela se restringiria ao estudo
das leis do entendimento e da razão, ela apenas se relacionaria com os objetos à priori, e não como a lógica formal, aos conhecimentos puros ou
empíricos sem distinção.
A parte da lógica transcendental que expõe os elementos
do conhecimento puro do entendimento e os princípios sem os quais nenhum objeto em geral pode ser pensado é a Analítica Transcendental.
Ela é, ao mesmo tempo, uma lógica de verdade. Com
efeito, nenhum conhecimento pode estar em contradição com a sua lógica sem
perder de imediato o seu conteúdo, isto é, toda a relação a qualquer objeto e, portanto, toda a verdade."
Assim a analítica transcendental, sendo parte da
lógica transcendental, não se propõe, ao contrário da lógica geral e não
pretende somente ocupar-se da forma do pensamento e não pretende trabalhar
unicamente com as ferramentas desta ( lógica geral): os princípios da
identidade e da não - contradição. Pretende sim restringir o seu campo ao
estudo das leis do entendimento e da razão aplicado aos objetos à priori.
Rememorando aquilo que sabemos sobre o entendimento em
Kant sabemos que ele "age" no campo da formulação dos conceitos exercendo
a sua acção sobre os dados da sensibilidade exercida esta sobre intuições
puras ( à priori) de conjuntos determinados de dados necessários para a
apreensão dos objetos.
Nestas aspecto, acrescenta Kant:" O entendimento foi
definido acima, apenas negativamente, como faculdade não sensível do
conhecimento ( na verdade e como vimos age sobre a sensibilidade e esta
por sua vez sobre intuições) (...) Assim, o conhecimento de todo o
entendimento, pelo menos, do entendimento humano, é um conhecimento por
conceitos, que não é intuitivo mas discursivo. O entendimento não pode
fazer outro uso destes conceitos a não ser, por seu intermédio, formular
juízos.
Estes são os seus limites, ou seja, os limites do
entendimento. Por sua vez em cada juízo há um conceito válido para
diversos conceitos ( entendendo que um juízo é um só pensamento, comparação,
dedução e construção de novos conceitos através da faculdade de julgar).
Estes, os juízos, por sua vez, e como vimos, podem
constituir-se em faculdade de julgar ( que acaba por ser já uma faculdade
racional, ou seja, de uma escala de conhecimento superior à escala do
entendimento), que, e por sua vez através de um processo chamado por Kant
de Unidade Sintética produzem o conceito de um objeto em geral , e,
segundo Kant, este último conceito é obtido à priori, na medida em que,
mesmo que não houvessem conceitos do entendimento ( anteriores à
formulação do juízo e da faculdade de julgar ) ele o entendimento (no seu
plano de razão ) continuaria a produzir conceitos e juízos de conceitos
com base nas categorias que o compõem ( ou seja, nas categorias constantes
da tábua das categorias ).
Intuição: é unicamente sensível na medida em que apenas
contém a maneira ( forma no sentido de base de sustentação) pela qual
somos afetados pelos objetos.
Tanto a sensibilidade como o entendimento ( ou o
sensível e o pensar ) estão ao mesmo nível e nenhum tem primazia sobre o
outro. Sem a sensibilidade nenhum objeto nos seria dado; sem o
entendimento nenhum seria pensado. Daí o repetido ditado de Kant
"Pensamentos sem conteúdo são vazios; intuições sem conceitos são cegas".
O conteúdo é-nos pois dado pela sensibilidade e os conceitos pelo
entendimento.
O entendimento nada pode intuir e os sentidos nada
podem pensar.
Esta analítica transcendental é a decomposição de todo
o nosso conhecimento a priori nos elementos do conhecimento puro do
entendimento. São condições desta decomposição:
a)- Que os conceitos sejam puros e não empíricos;
b)- Que não pertençam à intuição nem à
sensibilidade, mas ao pensamento e ao entendimento;
c)- Que sejam conceitos elementares e sejam bem
distintos dos derivados ou dos compostos de conceitos elementares;
d)- Que a sua tábua seja completa e abranjam
totalmente o campo do entendimento puro.
Esta analítica transcendental somente é possível
mediante uma ideia da totalidade do conhecimento à priori do entendimento
e pela divisão, determinada a partir dessa ideia, dos conceitos que a
constituem, por conseguinte, pela sua interconexão num sistema.
O entendimento: não é uma faculdade de intuição (
porque é uma faculdade não sensível do conhecimento) e fora da intuição
não há outro modo de conhecer senão por conceitos. É um conhecimento
discursivo ( porque não é intuitivo). O entendimento formula juízos de
conceitos e não pode fazer outra coisa com eles.
Nenhum comentário:
Postar um comentário